Presentes de Noel para São Gonçalo

Papai Noel chegou a São Gonçalo com muita raiva, depois de três horas e meia de engarrafamento na Ponte Rio-Niterói e na Alameda. Na primeira parada, em Alcântara, onde também encontrou um trânsito terrível na entrada do bairro, o bom velhinho arrancou a parte de cima da roupa, que “pinicava demais”, e ficou seminu, xingando diante dos celulares apontados pra ele.

– Que calor infernal é esse, minha gente? Não tem sombra na cidade? Chega de sofrimento.

Noel fechou os olhos, levantou a cabeça, estalou os dedos e a Praça Chico Mendes foi ocupada por um enorme shopping center, logo batizado como Tacho Alcântara.

– Pronto, agora os gonçalenses têm um prédio com ar-condicionado pra fugir do calor.

Surpreendido pelo milagre, o povo perguntou se Noel poderia ter plantado árvores com um projeto paisagístico ao invés de construir outro shopping, já que Alcântara é um bairro apertado, desorganizado e nada agradável.

– Árvore dá trabalho, tem que podar, cuidar e varrer as folhas do chão. Concreto não traz problemas, os donos da Aliansce Sonae cuidarão de tudo – respondeu o bom velhinho, carregando o casaco vermelho pendurado no braço direito.

Depois das tradicionais poses na praça de alimentação com dezenas de crianças no colo, Papai Noel seguiu acompanhado pela comitiva para o centro da cidade e ficou surpreso com o que viu no caminho.

– São Gonçalo está meio sujinha, hein! Tem uma geladeira velha naquela rua lá embaixo, estou vendo daqui. E aquilo ao lado é um sofá, tenho certeza – Noel apontou pra fora da janela do carro.

– Não se preocupe com isso, meu amigo – desconversou o funcionário da Prefeitura sentado no banco do carona, responsável por acompanhar o convidado ilustre.

– Estou aqui a pedido do povo para ajudar no desenvolvimento do município. Claro que me preocupo!

Num transe parecido com o primeiro, batendo com força as duas mãos três vezes, Noel fez surgir centenas de caçambas de lixo em pontos estratégicos da cidade para o descarte de entulho, manilhas, móveis, barras de ferro, pneus e correntes. Era evidente a alegria do velhinho por fazer o bem.

– O que mais vocês querem? Atenderei mais uma necessidade deste povo tão sofrido – Noel segurava o microfone instalado em um palco na Praça do Rodo.

“Segurança! Educação! Emprego!”, responderam os presentes e Papai Noel começou a pensar. O Tacho Alcântara garantiria o emprego da população. O funcionário da Prefeitura disse que as câmeras recém-instaladas tornariam São Gonçalo mais segura e livre do tráfico. Só faltava cuidar da educação.

Na velocidade do pensamento, Papai Noel pintou todas as escolas do município e, como bônus, destruiu o Plano de Cargos e Salários da Educação, em vigor há 20 anos, com o intuito de tornar a legislação mais “ágil e moderna”. Sem compreender as ações de Noel, os gonçalenses voltaram para casa na esperança de um novo Natal.

Quando a escravidão for abolida

Quando a escravidão for abolida, o jovem negro sairá à noite para se divertir, ao lado do branco, sem medo de ser o único parado pela polícia por causa da cor da sua pele, e frequentemente agredido. Ele entrará de mochila e chinelo no shopping e não será impedido de circular pelo segurança. O relógio que acabou de comprar de presente para seu pai não será roubado por aqueles que deveriam garantir sua proteção e o bom funcionamento do estabelecimento.

O primeiro artigo que nós leremos na Internet de manhã defendendo a igualdade racial terá sido escrito por um homem ou mulher negra. Negros ocuparão os postos mais cobiçados na Medicina, no Direito, na Engenharia, nos palácios em Brasília e nas novas economias, como aquelas ligadas à Cultura e ao Meio Ambiente. O medo exclusivo de existir como cidadão, que no passado apenas negros sentiam, será debatido nas escolas, museus e associações de moradores para que ele nunca mais volte. Para que ninguém sofra outra vez como vítima majoritária da violência.

O jovem trabalhador negro, recém-contratado pela empresa, não será mais barrado na portaria do prédio, confundido como entregador de quentinhas. Todos saberão que ele pode ser tanto o presidente da startup quanto o faxineiro ou secretário. Os levantamentos estatísticos dirão que brancos não são preferidos para ocupar cargos de chefia. E negros não tem maiores chances de sofrerem morte violenta.

O Brasil é escravo do racismo, da violência, da injustiça social e do ódio. No dia da liberdade o país não sentirá mais medo porque o extermínio racial terá, enfim, sido vencido. Depois de existir por séculos, matando e destruindo famílias, e mesmo assim jamais deixando de ser um tabu. Nesse dia, quem dirá ao microfone o que o Brasil deve fazer para garantir o bem-estar das crianças do país, negras, indígenas, imigrantes e brancas, será um homem negro, eleito pelo povo. Brancos já ocuparam esse espaço por tempo demais e por tempo demais mantiveram o país banhado no sangue de gente inocente.

Brancos não tentarão evitar que o poder e a economia sejam compartilhados porque entenderão que a alma brasileira é mestiça desde o nascimento. Desde o primeiro filho europeu e indígena de pai e mãe. Quando esse dia chegar, defenderemos juntos que a liberdade brasileira nunca seja atacada. Que nenhum povo, isolado nas florestas do Norte ou habitando favelas nas demais regiões, seja massacrado para benefício de ricos e corruptos.

Fisioterapia para Amanda e medicamento para Noah

No dia 8 de novembro de 2021, Amanda e Noah voltavam a pé pra casa, à noite, depois de Amanda levar o filho ao médico para uma consulta de emergência. Noah tem 4 anos e sofre de epilepsia.

No meio do caminho eles caíram em um buraco de um viaduto mal conservado pelo Estado na rodovia RJ-104, no bairro Alcântara, em São Gonçalo (RJ). Amanda quebrou ossos da bacia, do fêmur, do pé direito e teve traumatismo de múltiplos órgãos pélvicos. Noah quebrou o braço direito. Sozinhos no escuro embaixo do viaduto, os dois gritaram por socorro por mais de uma hora, nas margens de um rio poluído e ao lado de um lixão. Ratos e baratas passavam por cima deles e Amanda chegou a desmaiar ao lado do filho. O primeiro a socorrê-los foi um homem em situação de rua. 

Noah não teve sequelas físicas, mas chora quando a mãe fecha os olhos e ele lembra do desmaio. Amanda precisou passar por cirurgias e continua sobre uma cadeira de rodas desde o acidente. Mãe solo, nunca mais pôde trabalhar como diarista e ela e o filho se alimentam com doações e através do Auxílio Brasil. Por falta de transporte para a fisioterapia, Amanda não está se recuperando como deveria para um dia voltar a andar e trabalhar. Ela perdeu os movimentos do pé direito.

Amanda apresenta sintomas de depressão e seu pedido para ter esperança é:

1. R$ 400 para pagar o transporte por aplicativo para 20 sessões de fisioterapia.

2. R$ 720 para garantir por 1 ano o remédio de Noah contra a epilepsia. 

O medicamento se chama Depakene e o custo de R$ 60 por mês se tornou pesado demais, já que Amanda não pode trabalhar.

As sessões de fisioterapia foram receitadas em dezembro e continuam pendentes. Elas serão realizadas em um posto de saúde em um bairro vizinho. Devido ao acidente, Amanda ainda sente dores, não pode se deslocar sozinha na cadeira de rodas e não pode lutar pelo direito de um transporte gratuito. Não circula ônibus na comunidade onde ela mora, no bairro Raul Veiga.

Dezessete imagens de laudos médicos e documentos da Amanda estão no Google Drive. Contribuições de qualquer valor serão muito importantes para essa família!

Para acessar a vaquinha virtual para ajudar Amanda e Noah, clique aqui.