A gonçalense disse ao marido blogueiro:
– Eu já falei pra você um milhão de vezes: não vou me mudar de São Gonçalo. Eu nasci aqui, minha família mora aqui, minha vida toda é nessa cidade. Você tem filho, po! Nossa vida está indo tão bem, por que você fica arrumando problemas pra gente? – o rosto da esposa muda para uma expressão de tristeza contida, a voz treme no final da pergunta e parece que a qualquer instante ela vai cair no choro.
– Outra coisa, não entendo por que acorda tão cedo. Podia ficar na cama, dormir até um pouco mais tarde, aproveitar o fim de semana. Depois você reclama de que está com taquicardia. É claro que o coração vai disparar, você não descansa. Pensa nessas coisas o dia inteiro. Isso vai te matar, hein? Já está com o colesterol alto, ácido úrico, triglicerídios, tudo isso. Fica procurando problema onde não tem, meu Deus.
– Continua assim, vai botando mesmo o teu na reta enquanto os outros estão escondidos em Facebook, Instagram e por aí vai. Continua ouvindo as pessoas que só querem ver o circo pegar fogo, um bando de mal amados que não têm o que fazer na vida.
– Você acha que esses caras mandam recado? Desse tamanho, todo mundo te conhece. Vai contando mesmo que não estão te acompanhando. Daqui a pouco a gente tá andando na rua e sofre um atendado. Já pensou nisso, no seu arrependimento se algo assim acontecer? Eu não vou mais nem querer saber de você. Te prometo isso! Se algo acontecer com a gente, você nunca mais olha pra mim, nem pro seu filho. Escreve sobre o Brasil, poxa.
Nesse momento o marido se sentiu empolgado pra responder:
– Gostei da ideia, quero escrever sobre Bolsonaro. Vou escrever mais crônicas também, sabe? Os meninos jogando futebol, as pipas no alto…
– Tá vendo? É disso que estou falando. Você finge que não entende, cara. Você acha que Bolsonaro é flor que se cheire? Olha, tô falando pra você, tô avisando muitas vezes com antecedência, depois diz que não sabia. Se tiver uma ditadura no Brasil eu quero você bem quietinho, já falei. Eu moro em São Gonçalo minha vida inteira, não quero ir embora daqui não. Não aguento mais esse risco, você não faz nada do que eu digo.
– Tá bom amor, você tá certa, dessa vez eu parei.
Na semana seguinte o marido fez tudo de novo.