Moro perto de um vazamento de esgoto tão antigo que passou a fazer parte do cenário natural do bairro. Muitos gonçalenses sofrem com esse problema e outros semelhantes, como a lâmpada queimada no poste há meses, o buraco na porta de casa há anos e o lixo que nunca é recolhido. Reclamando dos políticos mas apaixonado pela submissão, o povo convive com as dificuldades causadas pelo descaso do Executivo e do Legislativo municipais.
Meu esgoto fica na rua Alexandre Muniz, perto da esquina com a Aldrovando Pena, no bairro Vila Três. É um bueiro que entupiu há dois anos, a tampa dele inclinou e em volta do buraco se formou uma barreira de terra, pedras e mato. Um rio de água suja sai do bueiro e corre pela sarjeta, margeando a calçada. Às vezes a podridão é negra como petróleo, em outras assume coloração esverdeada. O cheiro horrível piora no verão.
A política gonçalense flui como esse esgoto. Em condições normais, corre escondida por baixo da terra, ninguém vê, mas a podridão está lá, dentro do sistema. Em alguns dias o fluxo está mais forte. É quando roubam dinheiro da merenda escolar das crianças pobres, desviam verbas do setor de iluminação pública ou impedem a circulação de jornais que seriam distribuídos com denúncias envolvendo políticos.
Existe uma rede complexa de tubulações que joga os piores dejetos da sociedade dentro da política municipal. Assassinos se elegem para a Câmara de Vereadores graças à fama de assassinos, desde que os mortos sejam criminosos também. Nas secretarias de governo, para ser admitido basta ser parente do prefeito, enquanto secretários qualificados são exonerados sem explicação.
Durante o governo Mulim, o povo sentia o fedor sem saber de onde vinha. Até que o esquema entupiu, o encanamento estourou e a merda que passa por baixo do chão onde o gonçalense pisa passou a ver o céu. Graças à ação do Ministério Público e às investigações policiais, o cidadão é capaz de cheirar de tempos em tempos a índole oculta e podre de quem o governa.
A primeira coisa que os moradores da Alexandre Muniz veem e sentem ao abrir a porta de casa, todos os dias, é o esgoto escorrendo e seu odor. Pombos pousam na língua negra para ciscar alimento. Moscas infestam o local. A CEDAE não conserta o vazamento e a Prefeitura não dá a mínima importância. Ao invés de cobrar o reparo dos responsáveis, a Câmara de Vereadores discute as performances de Pablo Vittar. Por baixo das carências histórias de São Gonçalo, os políticos da cidade se arrastam.