Lições de Casa-grande & senzala para o Brasil atual

Lições de Casa-grande & senzala para o Brasil atual

A frase “A casa-grande surta quando a senzala vira médica” surgiu em 2016 com Suzane da Silva, jovem negra estudante de Medicina que sofreu ataques racistas na internet. E viralizou no ano seguinte a partir da postagem no Facebook de Bruna Sena, primeira colocada no vestibular de Medicina da USP de Ribeirão Preto e negra também. Casa-grande & senzala, obra-prima de Gilberto Freyre publicada em 1933, ajuda a entender o país onde vivemos e o protesto dessas estudantes. Continue lendo “Lições de Casa-grande & senzala para o Brasil atual”

Detalhes sobre índios assassinados

Nada supera o valor da vida individual humana. Sob esta máxima universal, não há assassinato mais reprovável que o outro. A brutalidade aplicada, no entanto, determina os detalhes estarrecedores de cada ato criminoso e os diferencia entre si. No Brasil merece destaque o grau de violência usado no assassinato de índios nativos desde o início do século 16, especialmente repleto dos requintes mais sórdidos que temos conhecimento.

Não é necessário citar passado tão distante. Há menos de uma semana um índio foi brutalmente assassinado em Belo Horizonte: enquanto dormia sozinho na calçada seu crânio foi afundado por pontapés de um psicopata racista. Poucos dias antes, em Imbituba (SC), a vítima foi uma criança indígena de dois anos de idade que, no colo da mãe, teve a garganta cortada por outro monstro diabólico. Antes de matar usando uma navalha, o lunático acariciou o rosto da criança e disse que era bela, lembra a mãe chocada. Loucura ou disfarce para o golpe fatal? Mais importante é a escolha meticulosa de quem seria atingido – um pequeno índio inocente e indefeso.

Detalhes produzem diferentes níveis de tristeza, alguns humanamente intoleráveis. Roubado por um morador de rua (como ele) enquanto agonizava no chão após aproximadamente quinze chutes e pisões que recebeu na cabeça, o índio adulto é tratado como indigente pelas autoridades mineiras até o momento. Não se conhece sua etnia, nome nem idade, é apenas um índio morto. Tão desconhecido quanto o paradeiro do assassino. Há centenas de anos dizimados, os primeiros habitantes desta terra são equivocadamente encarados como inquilinos indesejados, inclusive no século 21.

O menino Vitor, da tribo Caingangue, resistia à própria extinção vendendo artesanato na rodoviária da cidade catarinense, onde o degolaram. Estima-se que 5 milhões de índios foram assassinados antes dele, evidente genocídio praticado em território nacional e admitido com indiferença, característica que eleva significativamente a fatalidade do caso.

O racista de Belo Horizonte se aproximou da vítima, no meio da madrugada, e chutou tanto a cabeça dela que parecia tentar arrancá-la à força. Não houve tempo nem forças para qualquer tentativa de sobrevivência. Ele provavelmente não sabe que são enormes as chances de possuir origem materna indígena, seu ódio preconceituoso fere diretamente suas raízes raciais e culturais. A ignorância serviu novamente de base para a violência, fato que torna as mortes recentes mais alarmantes, apesar do destaque tímido entre os assuntos discutidos pela opinião pública.

Se o desenvolvimento da nação brasileira tivesse respeitado a figura do índio, bem como do negro de origem africana, a história da nossa formação seria menos desigual e cruel. Teríamos a maior riqueza de um povo, que tanto nos falta quando cometemos horrores: justiça social.