Três meninos muito abusados invadiram o chafariz do Parque das Águas que fica perto da entrada principal do condomínio, em Alcântara. Dois deles estavam de bicicleta, o terceiro se aproximou correndo, logo atrás. Chegaram gritando, Deus sabe de onde vieram. Passava das oito horas da noite e sequer estamos no verão.
Sem vergonha de nada, tiraram a camisa, os moleques, e mergulharam no chafariz, que naquele momento estava desligado. Se estivesse ligado, a diversão e o abuso teriam sido ainda maiores. Eles pulavam dentro d’água, chutavam água um no outro, jogavam água pra cima com os braços e corriam em círculo dentro do chafariz. Giravam, giravam mais rápido e rodavam mais do que o ônibus da linha 10 circula por São Gonçalo.
Pelo prazer de invadir o chafariz de novo, saíam da água, brincavam por alguns segundos no asfalto, se escondiam entre os carros estacionados e mergulhavam outra vez, mais barulhentos. Repetindo os mesmos gestos e brincadeiras sem parar.
Eles sabiam que estavam sendo observados e nem assim se endireitaram. Desbocados, começaram a gritar “Quem tá olhando, vai tomar no cu” para o prédio em frente, com nome de praia de Niterói. Os pobres gonçalenses, que nem na puberdade entraram, esnobaram a classe média da cidade no alto das suas varandas e janelas sem poder fazer nada contra aquela ousadia, aquele desrespeito ao seu caro IPTU.
Dentro do condomínio, piscinas grandes e vazias. Nenhuma criança dos mais de mil apartamentos tinha a mesma necessidade de se divertir daqueles três garotos brincando na água suja do chafariz. Para eles, o momento certo de viver era aquele. Tudo podia acabar logo e ninguém sabia quando haveria outra oportunidade.
De repente, um homem atravessou a rua e ficou de frente para eles com o braço estendido e apontando o dedo indicador como se fosse o cano de uma arma. Apontou para o primeiro garoto e ficou mirando ele, como se quisesse que fosse o primeiro atingido. Em seguida, os demais. Então disse algumas palavras em voz baixa, difícil de entender, aumentando o tom da ameaça.
– Expulsa todos eles daí! – gritou uma senhora da varanda com uma raiva inexplicável, todo o condomínio ouviu.
O primeiro garoto a fugir foi o que estava a pé. Esperto, ele precisava agir mais rápido do que os outros para não ser pego. Os demais também cataram a camisa do chão, subiram na bicicleta correndo e saíram em disparada levando a alegria embora, gargalhando mais alto do que no início da brincadeira.